Um estudo de abrangência global bastante recente publicado na revista Science investiga por que cobras (e seus parentes lagartos, sob o grupo Squamata) tornaram-se um dos grupos de vertebrados terrestres mais diversos e inovadores, tanto em forma quanto em função. Utilizando uma combinação de dados naturais (mais de 60.000 espécimes), uma vasta filogenia com dados genômicos (5.400 loci, ~1.018 espécies), inferências morfológicas e ecológicas, os autores mostram que as cobras passaram por uma espécie de "singularidade macroevolutiva" no momento de sua origem. Nesse ponto inicial ocorreram mudanças repentinas e profundas em traços como locomoção (perda de membros, corpo alongado), dieta, morfologia craniana e percepção sensorial. Essas inovações permitiram às cobras explorar nichos predatórios variados, diversificar-se muito mais rápido que lagartos, e influenciar fortemente a estrutura trófica das comunidades animais.

As cobras destacam-se entre os répteis por terem passado, logo em seus primórdios evolutivos, por um conjunto de transformações revolucionárias em forma, função e comportamento. Essa mudança súbita inclui a perda de membros, extensão corporal significativa, adaptação do crânio para uma alimentação especializada, e melhorias no sistema sensorial — alterações que permitiram explorar nichos predatórios que outros lagartos não acessaram.
O estudo revela que essas inovações ocorreram num momento singular da história evolutiva das cobras, quase como se elas tivessem entrado em um novo “modo evolutivo”, com taxas mais altas de mudança fenotípica e especialização ecológica. Essa singularidade não apenas influenciou sua própria radiação adaptativa, mas moldou também a estrutura ecológica de comunidades de vertebrados, especialmente no que diz respeito à dieta e ao impacto ecológico dos predadores.
Essa herança inicial — esse pulso macroevolutivo — é determinante para entender por que cobras hoje são tão diversas, distribuídas por habitats variados, com estilos de vida muito distintos (desde serpentes aquáticas até espécies fossoriais, arborícolas, etc.). Em outras palavras: a biodiversidade dos Squamata reflete não apenas uma acumulação gradual de mudanças, mas uma mudança brusca no começo que abriu caminho para os rumos posteriores da evolução desse grupo.
Texto Professor e Doutorando Rafael Moura








